É comum ouvirmos amigos, parentes e
até mesmo desconhecidos afirmarem que são tímidos. Uns, ainda que apresentem
certa extroversão social, juram que no fundo, bem lá no fundo, são tímidos essenciais.
Mas afinal, o que é timidez?
É com total franqueza que lhes afirmo
que até hoje, após muitos anos de
pesquisa,
não consegui elaborar nenhuma definição que possa, de fato, descrever o que é a
timidez. Para meu consolo, pude verificar, ao aprofundar meus estudos nessa
dimensão humana tão intrigante, que vários autores e pesquisadores também tentaram
elaborar teorias que pudessem desvendar essa faceta do comportamento humano que
aflige tantas pessoas.
Apesar de existirem muitas teorias
sobre a timidez, ninguém sabe exatamente o que ela significa.
Por outro lado, todos são unânimes em
reconhecer sua força. Isso
porque a timidez pode transformar
toda uma existência. Enquanto ela evoluir ao longo da vida, é capaz de estender
seus “tentáculos” por todos os aspectos da vivência humana. Isso inclui os planos profissionais, reduzindo ou
impossibilitando aspirações e desempenhos; as questões pessoais e sociais, como
dificuldades em relacionamentos afetivos (noivados, casamentos, criação de
filhos); a vida acadêmica e até o estabelecimento de elos de amizade e
companheirismo.
A timidez costuma se transformar, ou
melhor, se intensificar, à medida que amadurecemos e enfrentamos novos
desafios.
No dia a dia, costumamos identificar
a timidez pelo desconforto e pelas inibições que as pessoas apresentam em seus comportamentos,
quando se encontram na presença de outras pessoas. As manifestações mais comuns
e facilmente perceptíveis são: o silêncio, o retraimento físico, o rubor na
face (vermelhidão no rosto), a gagueira na fala e a sensação de ansiedade.
Quando utilizo a expressão “inibição do comportamento”, refiro-me à timidez que
pode ser observada na forma de quietude, do afastamento das pessoas e/ou de
ambientes agitados ou estimulantes.
Em minha prática profissional diária,
pude observar que os tímidos ficam inibidos ou retraídos quando enfrentam o
“novo”, principalmente em situações sociais não familiares. Eles se preocupam
excessivamente com os seus desempenhos sociais e também com o julgamento que as
pessoas farão de seus comportamentos. Para eles, situações sociais são eventos
imprevisíveis e incontroláveis.
Constato também que as pessoas
tímidas, em sua grande maioria, tendem a seguir rígidas e velhas rotinas, uma
vez que já foram vivenciadas e testadas por elas. Por isso mesmo, os tímidos
agem de forma relativamente constante, com o intuito de evitar as novidades e
as incertezas do quotidiano. Tal qual numa luta, criam uma tática de fuga ou
evasão para se sentirem mais seguros. No entanto, essa mesma segurança acaba
por limitar muito as possibilidades de experiências vitais, contribuindo para
alimentar ainda mais a engrenagem da timidez. É aquela velha história de que
tudo na vida tem seu lado positivo e seu lado negativo, até porque não existem
ganhos sem perdas, e viver é o eterno desafio de equilibrar a trama da nossa
existência.
Antes de prosseguir, é fundamental
fazer uma pequena, porém necessária, distinção entre timidez e introversão, pois a maioria das pessoas confunde essas duas
características do comportamento humano. Pessoas introvertidas não são necessariamente
tímidas. Elas têm as habilidades de convívio social e auto-estima suficiente
para obterem êxito nos relacionamentos interpessoais, porém preferem explicitamente
ficar sozinhas. Os introvertidos se sentem bem, e até mesmo revigorados, pela
solidão voluntária e não apresentam qualquer ansiedade ou necessidade de
aprovação quando estão na companhia dos outros. A inibição, os pensamentos de
derrota e a ansiedade sobre o desempenho, tão frequentes nos tímidos, não
ocorrem com os introvertidos. Quando as pessoas tímidas se abrem e revelam seus
sentimentos, geralmente em suas terapias, demonstram um desejo intenso de que
as outras pessoas as notem e as aceitem. No entanto, julgam-se incapazes de
exercer as habilidades, os sentimentos, os pensamentos e as atitudes
necessárias a uma boa interação social.
Importante ressaltar que o fato de as
pessoas tímidas terem dificuldades de se relacionar socialmente não significa
que elas sejam antissociais. Isso é um grande equívoco! É preciso ficar claro que indivíduos
antissociais são aqueles que se relacionam sem qualquer receio ou
constrangimento com diversas pessoas, mas não seguem nenhuma ética ou valores morais necessários para uma
boa e saudável convivência social. Esses indivíduos, também conhecidos como
sociopatas
ou psicopatas, geralmente estão camuflados de
pessoas “do bem” e utilizam-se da boa fé e generosidade dos outros para obterem
vantagens próprias. Os antissociais ou psicopatas são frios, manipuladores e
incapazes de sentir culpa, remorso ou compaixão. Abrangem desde os
estelionatários, golpistas e corruptos, até os perigosos transgressores de
regras sociais, como os assassinos ou serial killers.
Sendo assim, chamar pessoas tímidas
de antissociais é um erro grave e uma enorme injustiça cometida com elas.
Na timidez, ocorre justamente o
contrário. Pessoas tímidas querem se aproximar das pessoas de forma natural,
espontânea, mas a cruel presença da inibição é responsável por muito
sofrimento. Os tímidos apresentam sociabilidade, ou seja, possuem o desejo de
se relacionar com os outros, mas não sabem como fazê-lo.
A natureza da timidez é multi-factorial,
isto é, sua causa depende de vários fatores, que incluem basicamente o nosso
temperamento herança genética que determina nossa bioquímica cerebral e nossa
reactividade diante das coisas e nossas vivências acumuladas desde a mais tenra
idade. Por isso mesmo, a timidez se desenvolve na medida em que amadurecemos e
somos desafiados a enfrentar novas circunstâncias. É devido a essa natureza
mesclada (genética e vivências) que algumas pessoas passam por fases de timidez
e as superam, enquanto outras, em função de grandes decepções ou dificuldades
constantes, perdem as esperanças e se retraem de forma intensa para dentro de
si.
A timidez costuma ser bastante comum
na adolescência. Nessa fase da vida o indivíduo passa a se preocupar muito com
a imagem que os outros fazem dele. Não é à toa que, nesse período, tanto
meninos como meninas tendem a andar em grupos específicos, nos quais são aceites
por apresentarem determinados comportamentos, pensamentos, visuais e posturas.
Esses grupos funcionam como uma “muralha de proteção” para os adolescentes,
pois criam uma sensação de segurança coletiva e aliviam as dificuldades que
eles apresentam nas interações sociais mais amplas, que deveriam ser exercidas
de forma individual.
De certa forma, a timidez é uma
ansiedade normal, e podemos afirmar que a maioria das pessoas se sente ansiosa
em situações sociais. Exemplos típicos de circunstâncias que podem fazer
qualquer pessoa se sentir tensa ou tímida são: as entrevistas de emprego, falar
em público, encontros afetivos, festas surpresa de aniversário etc. Todos nós
já passamos por algum tipo de situação como essas e podemos lembrar, sem muito
esforço, as batidas aceleradas do coração, as mãos levemente trêmulas e húmidas
e aquele “friozinho” na barriga. Essa ansiedade social costuma passar
rapidamente, durante ou logo após o término do evento gerador da ansiedade.
Dessa maneira, a ansiedade social ou timidez não é incapacitante e pode, muitas
vezes, até contribuir para um bom desempenho em determinadas situações sociais.
Isso porque o tímido, por se saber tímido, tende a se preparar previamente e
com mais afinco para esses eventos. Tal qual a tristeza, que é uma reação
normal dos seres humanos, e a depressão (sua correspondente adoecida), a
timidez também é uma reação humana normal e, às vezes, útil. Já a fobia social
ou o transtorno de ansiedade social (TAS) é a sua equivalente patológica.
Referencias bibliograficas
BARBOSA, Silva Beatriz. mentes ansiosas. Editora Objetiva Ltda. Rio de Janeiro.
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